– Tarly, quando eu era um rapaz com metade da sua idade, a senhora minha mãe disse-me que, se andasse por aí de boca aberta, era provável que uma doninha a confundisse com a sua toca e descesse pela minha garganta. Se tem alguma coisa a dizer, diga. Caso contrário, cuidado com as doninhas – o velho fez um brusco gesto de dispensa. – Fora daqui, estou ocupado demais para tolices. Sem dúvida o meistre terá algum trabalho para você.
Sam engoliu em seco, deu um passo para trás e saiu correndo, tão depressa que quase tropeçou nas esteiras.
– Aquele rapaz é tão pateta quanto parece? – o Senhor Comandante perguntou depois de ele sair. “
– Se for do seu desejo me responder, o que quer do Rei Renly?
– O mesmo que quero de todos eles, moço. Homens, cavalos, espadas, armaduras, cereais, queijo, vinho, lã, cotas de malha… a Patrulha da Noite não é orgulhosa, aceitamos aquilo que nos é oferecido – os dedos tamborilaram nas pranchas mal cortadas da mesa. – Se os ventos tiverem ajudado, Sor Alliser deverá chegar a Porto Real na virada da lua, mas não sei se o jovem Joffrey prestará atenção nele. A Casa Lannister nunca foi amiga da Patrulha.
– Thorne tem a mão da criatura para lhes mostrar.
Era uma coisa horrível e branca, com dedos negros, que se agitava e torcia no frasco como se ainda estivesse viva.
– Seria bom que tivéssemos outra mão para enviar a Renly.
– Dywen diz que é possível encontrar qualquer coisa para lá da Muralha.
– Sim, Dywen diz. E da última vez que saiu em patrulha, disse que viu um urso com quatro metros e meio de altura – Mormont fungou. – Dizem que minha irmã tomou um urso como amante. Antes acredito
– Melhor – Jon tirou a luva de pele de toupeira e a mostrou. O braço estava coberto de cicatrizes, desde a mão até metade do antebraço, e ainda sentia a salpicada pele cor-de-rosa esticada e sensível, mas estava sarando. – Mas ainda dá comichão. Meistre Aemon diz que isso é bom. Deu-me um unguento para levar comigo quando partirmos.
– Consegue manejar a Garralonga apesar da dor?
– Suficientemente bem – Jon flexionou os dedos, abrindo e fechando o pulso, como o meistre tinha lhe ensinado. – Tenho de trabalhar os dedos todos os dias para mantê-los flexíveis, como Meistre Aemon recomendou.
– Aemon pode ser cego, mas sabe do seu ofício. Rezo para que os deuses nos permitam conservá-lo por mais vinte anos. Você sabe que podia ter sido rei?
Jon foi pego de surpresa.
– Ele contou-me que o pai foi rei, mas não… Julguei que talvez fosse um filho mais novo.
– E era. O pai do pai era Daeron Targaryen, o Segundo do Seu Nome, que incorporou Dorne no reino. Parte do pacto determinava que casasse com uma princesa de Dorne. Ela deu-lhe quatro filhos. O pai de Aemon, Maekar, era o mais novo desses quatro, e Aemon foi o terceiro filho
– Meistre Aemon recebeu o nome em honra do Cavaleiro do Dragão.
– É verdade. Há quem diga que o Príncipe Aemon, e não Aegon, o Indigno, foi o verdadeiro pai do Rei Daeron. Seja como for, ao nosso Aemon faltava o temperamento marcial do Cavaleiro do Dragão. Gosta de dizer que possuía uma espada lenta, mas uma inteligência rápida. Não à toa o avô o enviou para a Cidadela. Tinha nove ou dez anos, creio… e também era o nono ou décimo na linha de sucessão.
Jon sabia que Meistre Aemon contava mais de uma centena de dias do seu nome. Frágil, mirrado, murcho e cego, era difícil imaginá-lo como um garotinho da idade de Arya.
Mormont continuou:
– Aemon estava às voltas com seus livros quando o mais velho dos seus tios, herdeiro da coroa, foi morto num acidente de torneio. Deixou dois filhos, mas seguiram-no para a sepultura não muito tempo depois, durante a Grande Peste da Primavera. O Rei Daeron também foi levado, e por isso a coroa passou para o segundo filho de Daeron, Aerys.
– O Rei Louco? – Jon estava confuso. Aerys tinha sido rei antes de Robert, e isso não há muito tempo atrás.
– Não, este foi Aerys Primeiro. O que Robert depôs foi o segundo desse nome.
– Há quanto tempo isso se passou?