— Eu espero que isso não seja necessário por muito tempo — explicou Loren —, mas teremos que esperar até que as checagens microbiológicas estejam terminadas. Feche os olhos até que acabemos de passar pelo: processo de esterilização. Brant percebeu um pálido brilho violeta, e então houve um breve sopro de ar, após o que a comporta interna se abriu e os dois caminharam para a cabine de controle. Enquanto se sentavam lado a lado, a película resistente porém quase invisível em torno deles pouco dificultava seus movimentos. Ainda assim os mantinha separados, de tal maneira que era como se estivessem em mundos diversos, o que, em muitos sentidos, era verdade. Brant aprendia rápido, Loren tinha de admitir. Com mais algumas horas seria capaz de dirigir a máquina, embora jamais viesse a entender a teoria na qual ela se baseava. E neste ponto corria a lenda de que somente um punhado de homens entendera realmente a geodinâmica do superespaço, e estes estavam mortos há séculos. Eles ficaram logo tão absorvidos em discussões técnicas que quase se esqueceram do mundo exterior. De súbito, uma voz levemente aborrecida falou da direção do painel de controle: — Loren, nave chamando. O que está acontecendo? Faz meia hora que não ouvimos vocês. Loren estendeu a mão sem pressa para acionar um botão.
— Se vocês estão nos monitorando em seis canais de vídeo e cinco de áudio, isto é um pouco de exagero.
— Ele esperava que Brant tivesse entendido a mensagem: nós controlamos inteiramente a situação e não descuidamos de nada.
— Deixei a cargo de Moisés, ele está se encarregando das conversações como de costume. Através das janelas curvas eles podiam ver que Kaldor e a prefeita ainda se encontravam em meio a um animado diálogo, com o conselheiro Simmons participando ocasionalmente. Loren acionou outro controle e suas vozes amplificadas penetraram na cabine, mais alto do que se estivessem lá fora, ao lado deles.
— … nossa hospitalidade. Mas deve perceber, é claro, que este é um mundo extraordinariamente pequeno no que concerne à área de superfície seca. Quantas pessoas disse que havia a bordo de sua nave? — Eu não creio que tenha mencionado o número, senhora prefeita. De qualquer modo apenas alguns de nós chegarão a descer em Thalassa, apesar da beleza do lugar. Entendo perfeitamente a sua… ah… preocupação, mas não há o que temer. Dentro de um ano ou dois, se tudo correr bem, teremos voltado ao nosso curso. Ao mesmo tempo, gostaria de dizer que esta não é uma visita social, pois não esperávamos encontrar ninguém aqui! Mas uma nave estelar não faz uma delta V à metade da velocidade da luz se não tiver razões muito boas. Vocês possuem algo de que necessitamos e nós temos alguma coisa para lhes dar.
— O quê, se me permite perguntar.
— De nossa parte, se quiserem aceitar, oferecemos os séculos finais da arte e da ciência humanas. Mas devo adverti-los para que considerem o que tal dádiva pode trazer à cultura de vocês. Talvez não seja sensato aceitar tudo que temos a oferecer.
— Aprecio sua honestidade e compreensão. Vocês devem possuir tesouros inestimáveis. Que poderíamos oferecer em troca? Kaldor deu sua risada ressonante.
— Felizmente isto não é problema. Vocês nem notariam se nós levássemos sem pedir. Tudo que queremos de Thalassa são cem mil toneladas de água. Ou, para ser mais específico, de gelo.
11. DELEGAÇÃO
O presidente de Thalassa encontrava-se no cargo há apenas dois meses e ainda não se acostumara com sua má sorte. Não havia nada que se pudesse fazer quanto a isto, exceto ver o aspecto positivo de um trabalho ruim durante os três anos que iria durar. Certamente não serviria de nada pedir uma recontagem, o programa de seleção, que incluía a geração e a mistura de números de mil dígitos ao acaso, era a coisa mais próxima da sorte que a engenhosidade humana já pudera conceber. Existiam exatamente cinco maneiras de se evitar o perigo de ser arrastado para o palácio presidencial (com seus vinte aposentos, o suficiente para receber quase cem hóspedes): estar abaixo de trinta ou acima de setenta anos, ter uma doença incurável, ser mentalmente incapaz, ou então ter cometido algum crime grave. A única opção realmente aberta ao presidente Edgar Farradine era esta última, ele chegara mesmo a considerá-la seriamente. Ainda assim, tinha de admitir que, a despeito dos inconvenientes pessoais que lhe causara, esta era provavelmente a melhor forma de