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Queixaram-se `a pol'icia, e foi chamado o Manuel Peres, que, ouvindo at'onito o caso, ergueu as m~aos ao c'eu em gracas da bebedeira providencial que o havia colhido no dia do pagamento. Sem isso, disse, talvez, embora inocente, estivesse perdido.

Se n~ao fosse ela, explicou, nem pedida recibo, nem com certeza o pedir'ia como aquele que tinha, e apresentou, assinado pelos dois irm~aos, e que provava bem que tinha feito o pagamento em notas de cinquenta mil r'eis. «E se eu tivesse pago em notas de cem», rematou o Vig'ario, «nem eu estava t~ao b^ebado que pagasse vinte, como estes senhores dizem que t^em, nem muito menos eles, que s~ao homens honrados, mas receberiam». E, como era de justiga, foi mandado em paz.

O caso, por'em, n~ao p^ode ficar secreto; pouco a pouco se espalhou. E a hist'oria do «conto de r'eis do Manuel Vig'ario» passou, abreviada em «o conto do Vig'ario», para a imortalidade quotidiana, esquecida j'a da sua admir'avel origem.

Os imperfeit'issimos imitadores, pessoais como pol'iticos, do Mestre ribatejano nunca chegaram, que eu saiba, a qualquer simulacro digno do estratagema exemplar. Por isso 'e com ternura que relembro o feito deste grande portugu^es, e me figuro, em devaneio, que, se h'a um c'eu para os h'abeis, como constou que o havia para os bons, ali lhe n~ao deve ter faltado o acolhimento dos pr'oprios grandes mestres da Realidade — nem um leve brilho de olhos de Machiavelli ou Guicciardini, nem um sorriso moment'aneo de George Savile, Marqu^es de Halifax.

Maridos

A gente cria o costume e gosta mais por costume que por outra coisa. Que outra coisa 'e que podia ser. Depois, a gente afeicoa-se, mas afeicoa-se j'a doutra maneira, e s~ao uns filhos grandes que casam connosco.

Outros acham que a gente h'a-de gostar deles por isto ou por aquilo. Ora! A gente nem sabe porque gosta. Depois de gostar diz que gosta por isto ou por isto ou por aquilo, mas 'e s'o depois de gostar. Mas julgam que a gente gosta deles por serem fortes, ou por serem bonitos, ou por terem olhos azuis, ou qualquer coisa assim. 'E um pouco de tudo isso, senhor juiz, e n~ao 'e nada disso.

As mulheres s'erias a valer t^em um 'odio doido `as putas. Julga o merit'issimo juiz que 'e por serem s'erias? 'E, mas 'e por verem de que 'e que est~ao privadas por serem s'erias. Esta 'e a verdade —, senhor juiz — e o mais — n~ao faco o gesto por respeito.

N~ao h'a mulher nenhuma neste mundo — nem a mais s'eria, senhor juiz — que n~ao tenha invejado essas que l'a andam nas ruas `a procura dos homens — nenhuma, senhor juiz, se dissesse a verdade como a p^or o corac~ao ai em cima dessa mesa.

A alma da gente 'e uma coisa suja e o que vale 'e que a alma n~ao tem cheiro.

Isto, senhor juiz, e para que Vossa Excelencia saiba, e os senhores jurados, 'e o que todas as mulheres sentem. Umas nem d~ao por isso e v~ao vivendo como os empregados de escrit'orio que d~ao em velhos sempre a fazer a mesma letra; outras sentem e calam, e vivem s'o pr`os filhos, porque lhes ensinaram a ser s'erias — porque a gente aprende a ser s'eria como aprende a tocar piano; e outras n~ao aguentam, senhor juiz, e rebentam, e no meio disto tudo a gente n~ao sabe o que 'e melhor ou pior, porque o melhor 'e a gente n~ao avaliar dos outros, porque eles s~ao outros e a gente n~ao sabe o que vai l'a por dentro.

E vem uma vontade de meter a costura pela pia abaixo, e de ir para longe ao menos s'o para chorar `a vontade. A vida, senhor juiz — se o senhor juiz soubesse o que 'e a vida!

A falta de coragem 'e o que 'e o pior ~nas mulheres. A gente ainda tem medo dos tempos em que a lei nos batia mais que os homens. Ent~ao o senhor juiz julga que uma mulher s'eria usa saia curta por moda — l'a no 'intimo da alma d'ela? 'E para chamar os homens — mas o que ela n~ao se atreve 'e a deix'a-los chegar. Ent~ao h'a alguma mulher que se decotasse sen~ao para ser apalpada com os olhos?

Tenho, senhor juiz, tenho muitas coisas 'e a dizer e oxal'a o senhor juiz e os senhores jurados se n~ao importem que eu as diga. Porque esta, senhor juiz, 'e a verdade, e o que eu sinto, e o que toda a gente sente, se pensar nisso e eu quero dizer isso tudo, senhor juiz, sem tirar nem p^or.

O que faz mal `a gente 'e a imaginac~ao. Se uma mulher n~ao tem imaginac~ao 'e s'eria por sua natureza, senhor juiz, s'eria a valer.

Mas a gente nasce com o corac~ao que recebe, e 'e com esse que tem que sentir e penar.

Sempre o mesmo homem, senhor juiz — o mesmo homem todos os d'ias, com o mesmo corpo e a mesma maneira! Todas as noites, senhor juiz, e na mesma cama — nem a cama muda ao menos. E aquilo ao fim de tempo j'a n~ao era viver, nem coisa que se parecesse — era uma coisa entre comer para n~ao ter fome e fazer o servico da casa… Se os homens soubessem o que custa a aturar! Se soubessem o nojo que a gente tem por eles c'a dentro quando est'a encostada a eles!

E eu, senhor juiz, n~ao tinha outro rem'edio sen~ao mat'alo para estar bem com a minha consci^encia e com a Igreja.

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