O velho hábito obrigou Davos a levar a mão à bolsa de couro que já não estava lá.
– Perdi no rio. –
– O rio foi terrível – disse solenemente Salladhor Saan. – Mesmo da baía, eu podia ver e tremi.
Davos tossiu, cuspiu e voltou a tossir.
– Vi o
–
– O
Salladhor Saan apoiou uma mão no braço de Davos e deu-lhe um apertão.
– Não. Esses, não. Lamento, meu amigo. Eram bons homens, os seus Dale e Allard. Mas posso lhe dar este conforto: seu jovem Devan está entre aqueles que embarcamos no fim. O bravo rapaz nunca saiu de junto do rei, segundo dizem.
Por um momento sentiu-se quase tonto, de tão palpável que era seu alívio. Temera perguntar a respeito de Devan.
– A Mãe é misericordiosa. Tenho de encontrá-lo, Salla. Tenho de vê-lo.
– Sim – disse Salladhor Saan. – E também vai querer zarpar para o Cabo da Fúria, eu sei, para ver sua mulher e os dois pequenos. Estou aqui pensando que precisa de um novo navio.
– Sua Graça vai me dar um navio – disse Davos.
O liseno sacudiu a cabeça.
– Quanto a navios, Sua Graça não tem nenhum, e Salladhor Saan tem muitos. Os navios do rei arderam no rio, mas os meus não. Ficará com um deles, velho amigo. Velejará para mim, sim? Entrará deslizando em Bravos, Myr e Volantis na noite cerrada, sem ser visto, e sairá também deslizando, com sedas e especiarias. Ficaremos com bolsas gordas, sim.
– É gentil, Salla, mas meu dever é para com meu rei, não para com sua bolsa. A guerra continuará. Stannis ainda é o legítimo herdeiro do trono, segundo todas as leis dos Sete Reinos.
– Todas as leis não estão ajudando quando todos os navios se queimam, me parece. E o seu rei, bem, receio que vá acabar achando-o mudado. Desde a batalha não recebe ninguém, fica só matutando naquele Tambor de Pedra. A Rainha Selyse recebe em audiência em seu nome, com o tio, Lorde Alester, que anda se chamando de Mão. Ela deu o selo do rei a esse tio, para pôr nas cartas que ele escreve, e até em meu belo pergaminho. Mas o reino que eles estão governando é pequeno, pobre e rochoso, sim. Não há ouro, nem sequer um bocadinho para pagar ao fiel Salladhor Saan o que lhe é devido, e só restam os cavaleiros que levamos no fim, e nenhum navio além de minha pequena e brava frota.
Um súbito e torturante ataque de tosse obrigou Davos a se dobrar. Salladhor Saan aproximou-se para ajudá-lo, mas, com um gesto, ele pediu que se afastasse, e após um momento se recuperou.
– Ninguém? – rouquejou. – O que quer dizer com ele não receber ninguém? – sua voz soava úmida e espessa, até mesmo aos seus ouvidos, e por um momento a cabine pareceu oscilar ao seu redor.
– Ninguém além
Davos sacudiu a cabeça
– Vou ficar bem. Conte-me, Salla, preciso saber. Ninguém além de Melisandre?
O liseno lançou um longo olhar de dúvida para ele e prosseguiu com relutância.
– Os guardas estão mantendo todos os outros afastados, até sua rainha e a filhinha. Criados trazem refeições que ninguém come. – Inclinou-se para a frente e baixou a voz. – Ouvi estranhas conversas sobre fogos esfomeados dentro da montanha, e sobre como Stannis e a mulher vermelha descem juntos para observar as chamas. Há poços, dizem, e escadas secretas que descem até o coração da montanha, até lugares quentes onde só
– A mulher vermelha fez isso a ele – disse. – Enviou o fogo para nos consumir, para punir Stannis por tê-la posto de lado, para lhe ensinar que não tem esperança de vencer sem seus feitiços.
O liseno tirou uma gorda azeitona da tigela que se encontrava entre os dois.
– Não é o primeiro a dizer isso, meu amigo. Mas se eu fosse você, não estaria falando tão alto. Pedra do Dragão está cheia daqueles homens da rainha, ah, sim, e eles têm ouvidos aguçados e facas afiadas. – Enfiou a azeitona na boca.