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- Estive pensando muito em seu comentário na estação de trem. Sofrimento e prazer. Tire os sapatos.

Ela lembrou-se de que certa vez um dos seus fregueses pedira a mesma coisa, e ficara


excitado apenas por olhar seus pés. Será que a aventura não a deixava em paz? - Vou pegar um resfriado - insistiu.


- Faça o que estou dizendo - insistiu ele. - Não vai pegar nenhum resfriado, se não demorarmos muito. Acredite em mim, como eu acredito em você. Sem nenhuma razão aparente, Maria entendeu que ele estava querendo ajudá-la; talvez porque já tivesse bebido de uma água muito amarga, e achava que ela corria o mesmo risco. Não queria ser ajudada; estava contente com seu novo mundo, onde descobria que o sofrimento não era mais um problema. Entretanto, pensou no Brasil, na impossibilidade de encontrar um parceiro para compartilhar este universo diferente, e como o Brasil era mais importante que tudo em sua vida, ela tirou os sapatos. O chão estava cheio de pequenas pedras, que logo rasgaram suas meias, mas isso não tinha importância, compraria outras.


- Tire o casaco.


Ela podia ter dito que "não" mas, desde a noite anterior, acostumara-se à alegria de poder dizer "sim" a tudo que estava no seu caminho. Tirou o casaco, o corpo ainda quente não reagiu logo, mas aos poucos o frio começou a incomodá- la. - Vamos andar. E vamos conversar.


- Aqui é impossível: o chão está cheio de pedras. - Justamente por isso; quero que você sinta estas pedras, quero que lhe provoquem dor, que a machuquem, porque você deve ter experimentado, assim como eu experimentei, o sofrimento aliado ao prazer, e preciso arrancar isso de sua alma. Maria sentiu vontade de dizer: "Não precisa, eu gosto." Mas começou a caminhar sem pressa, as solas dos pés começaram a arder, devido ao frio e às pontas das pedras. - Uma das minhas exposições me levou ao Japão, justamente quando eu estava totalmente envolvido naquilo que você chamou de "sofrimento, humilhação, e muito prazer". Naquela época, eu achava que não havia um caminho de volta, que iria cada vez mais fundo, e nada mais restava na minha vida, exceto a vontade de punir e ser punido. "Afinal, somos seres humanos, nascemos cheios de culpa, ficamos com medo quando a felicidade se transforma em algo possível, e morremos querendo castigar os outros porque sempre nos sentimos impotentes, injustiçados, infelizes. Pagar seus pecados, e poder castigar os pecadores - ah, isso não é uma delícia? Sim, é ótimo." Maria andava, a dor e o frio tornavam difícil prestar atenção nas palavras dele, mas ela se esforçava.


- Hoje notei as marcas em seus pulsos.


As algemas. Tinha colocado várias pulseiras para disfarçar; entretanto, os olhos acostumados sempre sabem o que estão buscando. - Enfim, se tudo aquilo que você experimentou recentemente a está conduzindo a dar este passo, não sou eu que vou impedi-Ia; mas nada disso tem relação com a verdadeira vida.


- Passo?


- Dor e prazer. Sadismo e masoquismo. Chame como quiser, mas se estiver convencida de que este é o seu caminho, sofrerei, lembrarei do desejo, dos encontros, do passeio pelo Caminho de Santiago, de sua luz. Terei guardado em um lugar especial uma caneta, e cada vez que acender aquela lareira me lembrarei de você. Entretanto, não a procurarei mais.


-

- Maria sentiu medo, achou que era hora de recuar, falar a verdade, deixar de fingir


que sabia mais que ele.


-


- - O que experimentei recentemente, melhor dizendo, ontem, jamais tinha experimentado. E me assusta que, no limite da degradação, eu pudesse encontrar a mim mesma.


-


- Estava ficando difícil continuar conversando - seus dentes batiam de frio, e seus pés doíam muito.


-


- - Na minha exposição, em uma região chamada Kumano, apareceu um lenhador - continuou Ralf, como se não tivesse escutado o que ela dizia. - Não gostou dos meus quadros, mas foi capaz de decifrar, através da pintura, o que eu estava vivendo e sentindo. No dia seguinte, me procurou no hotel, e perguntou se eu estava contente; se estivesse, devia continuar fazendo 0 que gostava. Se não estivesse, deveria acompanhá- lo e passar uns dias com ele.


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