Seria um suplício que ele não conseguiria enfrentar. De fato, não colocara os pés na residência dos Leônidas desde que Kumar fizera sua última viagem e Brant retornara para consolar Mirissa. Já era quase como se Loren nunca tivesse penetrado em suas vidas. E estava abandonando a deles inexoravelmente, pois agora podia olhar para Mirissa com amor mas sem desejo. Uma emoção mais profunda, uma das piores mágoas que já conhecera ocupava agora a sua mente. Ele tinha desejado e esperado, pensando em ver seu filho, mas a nova data de partida da Magalhães tornava isso impossível. Embora tivesse ouvido as batidas do coração do filho misturadas com as da mãe, nunca seguraria aquela criança em seus braços. A nave auxiliar rumou para o local de encontro, no lado diurno do planeta, de modo que a Magalhães ainda se encontrava a cem quilômetros de distância quando Mirissa a viu. E mesmo conhecendo suas reais dimensões, ela lhe pareceu um brinquedo de criança, cintilando na luz do sol. De uma distância de dez quilômetros não lhe parecia maior. Seu cérebro e seus olhos insistiam que aqueles círculos escuros, em torno da seção central, eram apenas vigias. Só quando o interminável casco curvo da nave elevou-se ao lado dela, sua mente admitiu que eles eram as comportas de acoplamento e entrada de carga, e a nave auxiliar estava a ponto de penetrar numa delas. Loren olhou ansioso para Mirissa quando ela soltou o cinto de segurança. Este era o momento perigoso, quando pela primeira vez, livre de qualquer contenção, o passageiro super confiante percebia repentinamente que a gravidade zero não era tão agradável quanto parecia. Mas Mirissa parecia inteiramente à vontade enquanto flutuava através da comporta, impulsionada por suaves empurrões de Loren.
— Felizmente não há necessidade de ir à seção „G-l”, assim você evita o problema de se readaptar duas vezes. Não terá que preocupar-se com a gravidade novamente, até que estejamos de volta ao solo. „Seria interessante”, pensou Mirissa, „poder visitar os alojamentos na seção giratória da nave”, mas isso teria exigido intermináveis conversações educadas e contatos pessoais, que eram a última coisa que desejava agora. Estava satisfeita que o comandante Bey ainda estivesse em Thalassa, não haveria necessidade nem mesmo de uma visita cortês de agradecimento. Quando deixaram a câmara de ar, entraram por um corredor tubular, que parecia estender-se ao longo de todo o comprimento da nave. Num dos lados havia uma escada de mão, no outro, duas fileiras de laços flexíveis, convenientes para mãos ou pés, deslizavam lentamente em ambas as direções, ao longo de fendas paralelas.
— Este não é um lugar muito bom para se estar quando aceleramos — explicou Loren.
— Ele se torna então um poço vertical com dois quilômetros de profundidade. É ai que você precisa realmente da escada e dos corrimãos. Você só tem que segurar aquele laço e ele fará o resto. Eles flutuaram sem esforço, sendo arrastados por várias centenas de metros, passaram em seguida para um corredor em ângulo reto com o primeiro.
— Solte o laço — disse Loren, depois de percorrerem algumas dúzias de metros.
— Eu quero lhe mostrar uma coisa. Mirissa soltou seu apoio e eles flutuaram até parar ao lado de uma longa e estreita janela colocada num dos lados do túnel. Ela olhou através do vidro espesso para uma caverna de metal, imensa e brilhantemente iluminada. Embora houvesse esquecido sua localização, calculava que esta câmara cilíndrica devia abranger toda a largura da nave e que por isso aquela barra central devia se encontrar ao longo de seu eixo.
— A propulsão quântica — disse Loren orgulhosamente. Ele nem mesmo tentou dar nomes às formas de cristal metal encoberto, aos arcobotantes de curioso formato projetandose das paredes da câmara. As constelações de luzes e a esfera de um negro total, ainda que sem detalhes, de algum modo pareciam estar girando… Depois de algum tempo Loren disse: — A maior conquista do gênio humano. A última dádiva da Terra a seus filhos. Um dia ela nos tornará senhores da Galáxia. Havia uma arrogância nestas palavras que fez Mirissa estremecer. Este era o velho Loren falando como antigamente, antes de ser amolecido por Thalassa. „Assim seja”, ela pensou, „uma parte dele mudou para sempre.” — Você acha — ela perguntou suavemente Galáxia chegará pelo menos a se dar conta? — que a Entretanto, estava impressionada, e olhou por um longo tempo para as formas imensas e sem significado que transportaram Loren através dos anos-luz. Não sabia se devia abençoá-las, pelo que tinham lhe trazido, ou amaldiçoá-las, pelo que logo levariam embora. Loren a conduziu uma vez mais pelo labirinto, cada vez mais para dentro da Magalhães. Nem uma vez eles depararam com outra pessoa, o que era um indicador do tamanho da nave e da escassez de sua tripulação.
— Estamos quase lá — disse Loren, numa voz agora baixa e solene.
— E este é o Guardião.