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costume muito estranho: toda mulher que nasceu na Suméria é obrigada, pelo menos uma vez na vida, a ir até o templo da deusa Ishtar e entregar seu corpo a um desconhecido, como símbolo de hospitalidade, e por um preço simbólico." Depois iria perguntar quem era esta deusa; talvez também ela a ajudasse a recuperar algo que havia perdido, e não sabia o que era. - A influência da deusa Ishtar espalhou-se por todo o Oriente Médio, atingiu a Sardenha, Sicília, e os portos do mar Mediterrâneo. Mais tarde, durante o Império Romano, outra deusa, Vesti, exige a virgindade total, ou a entrega total. Para manter o fogo sagrado, mulheres do seu templo se encarregavam de iniciar os jovens e os reis no caminho da sexualidade: cantavam hinos eróticos, entravam em transe, e entregavam seu êxtase ao universo, numa espécie de comunhão com a divindade. Ralf Hart mostrou uma fotocópia de algumas letras antigas, com a tradução em alemão no pé da página. Declamou-a devagar, traduzindo cada verso: Quando estou sentada à porta de uma taverna, eu, Ishtar, a deusa, sou prostituta, mãe, esposa, divindade. Sou o que chamam de Vida Embora vocês chamem de Morte. Sou o que chamam de Lei Embora vocês chamem de Marginal. Eu sou o que vocês buscam E aquilo que conseguiram. Eu sou aquilo que vocês espalharam E agora recolhem meus pedaços. Maria soluçou um pouco, e Ralf Hart riu; sua energia vital estava voltando, a "luz" começava de novo a brilhar. Era melhor continuar com a história, mostrar os desenhos, fazê-la sentir-se amada.


- Ninguém sabe por que a prostituição sagrada desapareceu, depois de haver durado pelo menos dois milênios. Talvez por causa das doenças, ou de uma sociedade que mudou suas regras quando as religiões também mudaram. Enfim, isso não existe mais, e não voltará a existir. Hoje em dia, os homens controlam o mundo, e o termo serve apenas para criar um estigma, e chamar de prostituta qualquer mulher que ande fora da linha. - Você pode ir ao Copacabana amanhã?


Ralf não entendeu a pergunta, mas concordou imediatamente. Do diário de Maria, na noite em que caminhou descalça pelo jardim Inglês em Genève:


Não me interessa se algum dia já foi sagrado ou não, mas EU ODEIO O QUE FAÇO. Está destruindo minha alma, me fazendo perder o contato comigo mesma, me ensinando que a dor é uma recompensa, o dinheiro compra tudo, justifica tudo. Ninguém é feliz à minha volta; os clientes sabem que precisam pagar por aquilo que deveriam ter de graça, e isso é deprimente. As mulheres sabem que precisam vender aquilo que gostariam de entregar apenas por prazer e carinho, e asso é destruidor. Lutei muito antes de escrever isso, aceitar que estava infeliz, descontente - precisava e ainda preciso resistir mais algumas semanas.


Entretanto, não dá mais para ficar quieta, fingir que está tudo normal, que é um período, uma época da minha vida. Quero esquecê- la, preciso amar - só isso, preciso amar. A vida é curta - ou longa demais - para que eu possa me dar ao luxo de vivê-la tão mal. 194


Não é a casa dele. Não é a sua casa. Não é nem Brasil, nem Suíça, mas um hotel - que pode estar em qualquer lugar do mundo, sempre com os mesmos móveis, e aquele ambiente que pretende ser familiar, o que o faz ainda mais distante.

Não é o hotel com a bela vista para o lago, a lembrança da dor, do sofrimento, do


êxtase; suas janelas dão para o Caminho de Santiago, uma rota de peregrinação mas não de penitência, um lugar onde as pessoas se encontram nos cafés à beira da estrada, descobrem a "luz", conversam, ficam amigas, se apaixonam. Está chovendo, e a essa hora da noite ninguém anda por ali, mas andaram durante muitos anos, décadas, séculos - talvez o caminho precise respirar, descansar um pouco dos muitos passos que todos os dias se arrastam por ele.


Apagar a luz. Fechar as cortinas.


Pedir que tire a roupa, tirar também a sua. A escuridão física nunca é total, e quando os olhos já estão acostumados, poder ver, no contorno de uma pequena luz que entra não se sabe de onde, a silhueta do homem. Da outra vez que se encontraram, apenas ela havia deixado parte do seu corpo nu.


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