– Um lugar de perigo – ressaltara o pai. Os filhos tinham-lhe lançado olhares compadecidos, até mesmo o jovem Maric.
Bem, a última parte era bastante verdadeira, e não pediria desculpa por isso. Seaworth possuía sonoridade nobre, mas no seu âmago ainda era Davos da Baixada das Pulgas, tornando à sua casa, à sua cidade erguida sobre as suas três grandes colinas. Sabia mais de navios, velas e costas que qualquer outro homem nos Sete Reinos, e tinha participado do seu quinhão de lutas desesperadas, espada contra espada, num convés molhado. Mas àquele tipo de batalha chegava virgem, nervoso e amedrontado. Os contrabandistas não fazem soar cornos de guerra nem erguem estandartes. Quando cheiram perigo, içam as velas e fogem à frente do vento.
Se tivesse sido ele o almirante, teria feito tudo de outra forma. Para começar, teria enviado um punhado de seus navios mais rápidos rio acima, a fim de sondar aquilo que os esperava, em vez de atacar imprudentemente. Quando fizera essa sugestão a Sor Imry, o Senhor Capitão Supremo agradeceu cortesmente, mas seus olhos não tinham se mostrado tão delicados.
Com quatro vezes mais navios do que o rei rapaz, Sor Imry não via motivos para cautelas ou táticas de engano. Organizara a frota em dez linhas de batalha, cada uma com vinte navios. As primeiras duas subiriam o rio para dar batalha e destruir a pequena frota de Joffrey, ou “os brinquedos do rapaz”, como Sor Imry os chamava, para diversão dos senhores seus capitães. Aquelas que viriam atrás desembarcariam companhias de arqueiros e lanceiros sob as muralhas da cidade, e só então se juntariam à batalha no rio. Os navios menores e mais lentos da retaguarda transbordariam a parte principal da tropa de Stannis a partir da margem sul, protegidos por Salladhor Saan e seus lisenos, que permaneceriam na baía para o caso de os Lannister possuírem outros navios escondidos ao longo da costa, preparados para cair sobre a retaguarda da frota de Stannis.
Para ser justo, havia motivos para a pressa de Sor Imry. Os ventos não os tinham tratado com gentileza na viagem de Ponta Tempestade. Tinham perdido duas cocas nos rochedos da Baía dos Naufrágios, no mesmo dia em que zarparam, uma péssima maneira de começar. Uma das galés de Myr fora a pique nos Estreitos de Tarth, e uma tempestade assolara-os ao entrarem na Goela, espalhando a frota por metade do Mar Estreito. Todos os navios, exceto doze, tinham por fim se reagrupado atrás da ponta abrigada do Gancho de Massey, nas águas mais calmas da Baía da Água Negra, mas não antes de perderem um tempo considerável.
Stannis devia ter chegado à Torrente vários dias antes. A estrada do rei seguia reto de Ponta Tempestade a Porto Real, uma rota muito mais curta do que por mar, e a maior parte de sua tropa estava a cavalo; quase vinte mil cavaleiros, cavalaria leve e cavaleiros livres, o involuntário legado de Renly ao irmão. Teriam feito um bom tempo, mas cavalos de batalha couraçados e lanças de três metros e meio pouco adiantariam contra as águas profundas da Torrente da Água Negra e as altas muralhas de pedra da cidade. Stannis estaria acampado com seus senhores na margem sul do rio, sem dúvida fervendo de impaciência e perguntando-se o que Sor Imry teria feito de sua frota.
Ao largo do Rochedo do Badejo, dois dias antes, tinham avistado meia dúzia de esquifes de pesca. Os pescadores tinham fugido ao vê-los, mas um por um foram alcançados e abordados.
– Uma colherada de vitória é a coisa certa para sossegar o estômago antes da batalha – Sor Imry declarara satisfeito. – Deixa os homens famintos por doses maiores.
Mas Davos se interessara mais pelo que os cativos tinham a dizer a respeito das defesas de Porto Real. O anão andara atarefado construindo uma espécie de dique flutuante para fechar a foz do rio, embora os pescadores diferissem quanto à obra ter sido concluída ou não. Deu por si desejando que sim. Se o rio lhes estivesse vedado, Sor Imry não teria alternativa a não ser parar e avaliar a situação.
O mar estava cheio de sons: gritos e chamados, cornos de guerra, tambores e trinados de flauta, o bater da madeira na água à medida que milhares de remos se erguiam e caíam.
– Manter a linha – Davos gritou. Uma rajada de vento puxou seu velho manto verde. Um justilho de couro fervido e um elmo redondo que tinha aos pés eram sua única armadura. Acreditava que, no mar, o aço pesado era mais capaz de tirar a vida de um homem do que de salvá-la. Sor Imry e os outros capitães de elevado nascimento não partilhavam de seu ponto de vista; cintilavam enquanto percorriam os respectivos conveses.