Quanto ao sexo, até aquele momento nada tinha acrescentado a sua vida: era abrir as pernas, exigir que colocassem um preservativo, gemer um pouco para aumentar a possibilidade de uma gorjeta (graças à filipina Nyah ela descobrira que os gemidos podiam render cinqüenta francos a mais), e tomar uma ducha logo após a relação, de modo que a água lavasse um pouco a sua alma. Nada de variações. Nada de beijo - o beijo, para uma prostituta, era mais sagrado que qualquer outra coisa. Nyah lhe ensinara que devia conservar o beijo para o amado da sua vida, como no conto da Bela Adormecida; um beijo que a faria despertar do sono e voltar ao mundo do conto de fadas, no qual a Suíça se transformava de novo no país do chocolate, das vacas e dos relógios. Também nada de orgasmos, prazer, ou coisas excitantes. Na busca para ser a melhor de todas, Maria andara assistindo a algumas sessões de filmes pornográficos, esperando aprender algo que pud esse usar no seu trabalho. Tinha visto muita coisa interessante, mas que não se animava a praticar com os seus clientes - demoravam muito, e Milan sempre ficava contente quando as mulheres se encontravam com três pessoas por noite. No final do semestre, Maria tinha colocado sessenta mil francos no banco, passara a comer em restaurantes mais caros, comprara uma TV (que nunca usava, mas que gostava de ter perto) e agora considerava seriamente a possibilidade de mudar para um apartamento melhor. Já podia comprar livros, mas continuava a freqüentar a biblioteca, que era sua ponte para o mundo real, mais sólido e mais duradouro. Gostava de conversar com a bibliotecária, que estava feliz porque Maria finalmente arranjara um amor, e talvez um emprego, embora não perguntasse nada, já que os suíços são tímidos e discretos (verdadeira mentira, porque no Copacabana e na cama eram desinibidos, alegres ou complexados como qualquer outro povo do mundo).
Do diário de Maria, em uma tarde morna de domingo: Todos os homens, baixos ou altos, arrogantes ou tímidos, simpáticos ou distantes, têm uma característica em comum: chegam à boate com medo. Os mais experientes escondem seu pavor falando alto, os inibidos não conseguem disfarçar e começam a beber para ver se a sensação vai embora. Mas não tenho dúvida, com raríssimas exceções - e estes são os "clientes especiais", que Milan ainda não me apresentou - eles estão assustados. Com medo de quê? Na verdade, sou eu quem devia estar tremendo. Sou eu quem sai, vai para um lugar estranho, não tenho força física, não carrego armas. Os homens são muito estranhos, e não estou falando apenas daqueles que vêm até o Copacabana, mas de todos que conheci até hoje. Podem bater, podem gritar, podem ameaçar, mas morrem de medo de uma mulher. Talvez não daquela com quem se casaram, mas sempre existe uma que os assusta e os submete a todos os seus capachos. Nem que seja a própria mãe. 86
A homens que conhecera desde que chegara em Genève faziam de tudo para parecerem seguros de si, como se governassem o mundo e suas próprias vidas; Maria, porém, via nos olhos de cada um o terror da esposa, o pânico de não conseguir ter uma
ereção, de não serem machos o suficiente nem diante de uma simples prostituta, a quem
estavam pagando. Se fossem a uma loja e não lhes agradasse o calçado, seriam capazes de voltar com o recibo na mão e exigir o reembolso. Entretanto, embora também estivessem pagando por uma companhia, se não tivessem uma ereção, jamais voltariam à mesma boate, porque achavam que a história teria se espalhado entre todas as outras mulheres; seria uma vergonha.
"Sou eu quem devia ter vergonha por não conseguir excitar um homem. Mas, na verdade, são eles que têm."
Para evitar estes constrangimentos, Maria procurava deixá-los sempre à vontade, e quando algum deles parecia mais bêbado ou mais frágil que o normal, evitava o sexo e concentrava-se apenas em carícias e masturbação - o que os deixava muito contentes - por mais absurdo que parecesse esta situação, já que podiam masturbar-se sozinhos. Era preciso sempre evitar que ficassem envergonhados. Aqueles homens, tão poderosos e arrogantes em seu trabalho, onde lidavam sem parar com empregados, clientes, fornecedores, preconceitos, segredos, atitudes falsas, hipocrisia, medo, opressão, terminavam o dia em uma boate, e não se importavam em pagar trezentos e cinqüenta francos suíços para deixarem de ser eles mesmos durante a noite. "Durante a noite? Ora, Maria, você está exagerando. Na verdade, são quarenta e cinco minutos, e mesmo assim, se descontarmos tirar a roupa, ensaiar algum falso carinho, conversar alguma coisa óbvia, vestir a roupa, reduziremos este tempo para onze minutos de sexo propriamente dito."