Para seu imenso alívio, localizara todas as suas damas depois do incêndio, assim como os criados e clientes, à exceção de Fujiko, Hinodeh,
O horror do incêndio na Yoshiwara de Iedo, doze anos antes, lhe ensinara a lição. O fogo quase a matara e a seu cliente, um rico mercador de arroz da Gyokoyama. Ela o salvara, despertando-o do estupor da embriaguez, quase o arrastando para fora, ao risco da própria vida. Escapando pelos jardins, descobriram-se subitamente cercados pelo fogo, acuados, mas salvaram-se da morte ao cavarem uma vala na terra macia, com a ajuda da adaga que ela sempre levava na
Mas o cliente não a esquecera. Ao se recuperar, convencera o pessoal da Gyokoyama a lhe emprestar os recursos para abrir sua própria casa de chá e depois passara a se dedicar a outra dama. O investimento já dera um lucro cinco vezes maior que o seu valor. Naquele incêndio, mais de cem cortesãs, dezesseis
— A casa das Dezesseis Orquídeas seria nessa direção, ama,
O servo hesitou, indeciso, entre as nuvens de fumaça. Ao redor, havia apenas brasas e cinzas, uns poucos suportes de pedra patéticos, sem que se pudesse divisar os caminhos sinuosos, sem os marcos de pedra para orientá-los. De repente, uma rajada de vento removeu cinzas para revelar os suportes de um bangalô e um dragão de pedra rachado pelo calor. Raiko reconheceu-o e compreendeu onde se encontravam. O bangalô de Hinodeh.
— Devemos voltar um pouco — disse ela. Foi nesse instante que alguma coisa atraiu sua atenção. Um brilho. — Espere um pouco. O que é aquilo?
— Onde, ama?
Raiko esperou. Outra vez o vento agitou as brasas e outra vez um objeto faiscou, um pouco à frente, à direita.
— Ali!
— Ah, sim.
Com todo cuidado, ele usou um galho enegrecido, sem folhas, para abrir caminho, foi se adiantando, ergueu o lampião para espiar à frente. Outro passo cauteloso, só para recuar apressado, quando uma nova rajada jogou fagulhas em sua direção.
— Vamos voltar. Procuraremos amanhã.
— Um momento, ama.
Estremecendo com o calor, ele usou o galho para remover mais cinzas. E soltou uma exclamação aturdida. Os dois corpos carbonizados estavam estendidos lado a lado, a mão esquerda de um na mão direita de outro. O brilho era de um anel de sinete de ouro, retorcido, parcialmente derretido.
— Ama!
Consternada, como uma estátua, Raiko postou-se ao lado dele.
E, também no mesmo instante, seu espírito se animou, à visão das mãos dadas, a imagem que eles formavam em seu leito de brasas parecendo ser um berço de pedras preciosas, de rubis, faiscando, morrendo e renascendo a cada corrente de ar... como se os dois fossem permanecer assim até o final dos tempos.
Ah, muito triste, pensou Raiko, as lágrimas aflorando, muito triste, e ao mesmo tempo tão lindo. Como eles parecem serenos, deitados aqui, como parecem abençoados, morrendo juntos, de mãos dadas. Devem ter se decidido pela taça de veneno e partiram juntos, como um só. Muito sábio. A melhor coisa, para ambos.
—
Raiko se afastou, com lágrimas entre amargas e doces, mas contente pela beleza que testemunhara. Mais uma vez, dois seres haviam escolhido o caminho para o ponto de encontro.
Um súbito pensamento aflorou em sua mente.